Além de festa em vagão, trens acumulam prejuízo com furtos, tiros e morte no Rio
Nos trens do Rio de Janeiro, não é só a realização de baile funk dentro de um vagão em pleno auge da pandemia do novo coronavírus que ameaça a operação do sistema ferroviário. Furtos de cabos, trocas de tiros entre grupos rivais e até morte compõem o cenário do cotidiano de quem precisa utilizar diariamente as linhas férreas.
Em março, um vídeo circulou na internet mostrando uma multidão aglomerada –sem máscaras, alguns com cervejas na mão– num vagão da SuperVia. A festa teria coincidido com o dia em que o Brasil registrou 2.815 mortes causadas pela Covid-19.
Já no último domingo (4), uma mulher de 26 anos morreu após ser baleada num assalto no interior de um trem na zona norte do Rio. Só neste ano, já foram registrados ao menos seis casos de tiroteios envolvendo o sistema ferroviário do Rio.
Dois dos suspeitos de participarem do roubo foram baleados por um policial que estava no vagão –um deles também morreu após dar entrada no hospital municipal Souza Aguiar. O crime ocorreu às 7h, quando a composição passava pela estação Sampaio, que liga Japeri, na região metropolitana, à estação Central do Brasil, no centro.
Além desse crime, só neste ano já foram registrados ao menos cinco casos de tiroteios no entorno das linhas férreas, que prejudicaram a operação do sistema por 11 horas e 18 minutos. No ano passado, foram 36 tiroteios nas proximidades das linhas, responsáveis por interromper o funcionamento por 40 horas e 24 minutos.
Antes do crime deste domingo, a última grande paralisação de parte do sistema foi em março, na estação de Vigário Geral, que durou 5 horas e 35 minutos. Deixaram de ser transportados em função disso 18 mil pessoas.
Quando há tiroteios, os trens ficam parados em um local seguro e só retomam a circulação quando recebem ordem. Após as trocas de tiros entre grupos rivais, são feitas vistorias em cabos da rede aérea para ver se há algum problema para a retomada da operação.
Mas, além disso, só nos três primeiros meses deste ano, foram furtados 5.986 m de cabos de sinalização, praticamente o mesmo total que o ano passado inteiro –6.174 m.
No ramal Japeri, a quantidade de furtos neste ano impressiona: foram 60 no trimestre, ante 7 no mesmo período de 2020. Foram levados 2.186 m, enquanto em 2020 o total foi de 455 m.
De que forma esses furtos impactam na operação dos trens? Eles fazem com que aumente o intervalo entre as composições, especialmente durante a manhã, período do dia com intenso tráfego com destino à Central do Brasil. Nessas condições, o comando para o maquinista seguir viagem tem de ser feito por meio de rádio, e não mais de forma automática.
Os cabos são furtados, em geral, por serem compostos por cobre, material fácil de ser vendido em qualquer ferro-velho.
E tudo isso ocorrendo num momento em que todos os sistemas de transporte no país enfrentam uma crise sem precedentes devido à queda na circulação de pessoas por conta da pandemia.
De acordo com a SuperVia, nos primeiros 12 meses da pandemia, a partir de meados de março de 2020, a sua perda financeira chegou a R$ 452 milhões, graças à redução de mais de 83 milhões de passageiros transportados.
Em média, a SuperVia tem transportado cerca de 320 mil passageiros por dia, praticamente a metade do que era registrado antes do início da pandemia.
A projeção da concessionária é de que o movimento de passageiros retome os níveis pré-Covid-19 somente em 2023, devido ao prolongamento da crise econômica em decorrência do novo coronavírus e do próprio andamento da doença, que tem batido recordes de infecções e mortes.
A concessionária ainda cita gastos de R$ 3,5 milhões com materiais de limpeza para trens e estações, como peróxido de hidrogênio (para higienizar trens e catracas) e 45 mil litros de álcool em gel 70% em dispensers e totens nas estações.
Sobre o funk dentro do trem, a SuperVia informou que registrou ocorrência policial na 4ª DP, que está contribuindo com as informações necessárias e que “repudia o comportamento registrado no vídeo, que mostra a prática de atos proibidos por lei, especialmente neste momento delicado de pandemia”.
“Incluindo pessoas sem máscaras, ouvindo música alta, fumando e consumindo bebidas alcoólicas, o que pode causar transtornos e riscos aos demais passageiros. A concessionária vai apurar o episódio e adotar as medidas jurídicas cabíveis, comunicando as autoridades competentes para investigação e punição dos responsáveis. A empresa esclarece que a fiscalização em relação ao uso de máscara cabe ao poder público”, diz nota da empresa.
No caso do tiroteio de domingo, a concessionária informou que acionou o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e a PM e que a passageira foi levada para o hospital municipal Salgado Filho, mas não resistiu.