Estudo aponta ‘ilhas’ ferroviárias no país e 30% da malha sem utilização
Concessões desatualizadas, falta de compartilhamento dos trilhos e um terço da malha ferroviária sem uso.
Esses são alguns dos problemas apontados pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) em estudo divulgado nesta quinta-feira (7) que mostra as dificuldades para o crescimento do transporte de cargas por meio de ferrovias, exatamente num momento em que o país sofreu desabastecimento devido à greve dos caminhoneiros.
O estudo aponta que, além de cerca de 30% dos trilhos ferroviários do país estarem inutilizados, 23% estão sem condições de serem colocados em operação.
Chamado “Transporte ferroviário: colocando a competitividade nos trilhos”, foi produzido com base em dados da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e será entregue pela CNI aos candidatos à Presidência da República.
“As concessões da década de 90, hoje, estão desatualizadas. Quem tem a concessão vai investir só no que ela usa. O investimento em ferrovia é muito elevado. O que discutimos no estudo é que, como as concessões vão acabar nos próximos dez anos e as perspectivas de mudanças das empresas não são tão favoráveis assim, dado o contexto econômico, o ideal é antecipar as renovações”, disse Ilana Ferreira, especialista em políticas e indústria da CNI.
A malha ferroviária nacional tem cerca de 28,2 mil quilômetros de extensão, conforme o estudo, dos quais 8,6 mil quilômetros não são usados.
De acordo com a CNI, as empresas operam sem concorrência e há dificuldades de interconexão das malhas ferroviárias. Isso acaba criando “ilhas” e impedindo o desenvolvimento do setor.
Por isso, ainda segundo a avaliação da confederação, é essencial assegurar o “direito de passagem” de uma malha para outra para que o transporte de cargas seja sustentável.
“Essa modalidade permite que uma concessionária trafegue na malha de outra para dar prosseguimento, complementar ou encerrar uma prestação de serviço. Na prática, a detentora das operações de um trecho pode, assim, transitar ou entregar cargas na malha administrada por outra companhia”, diz trecho de nota da CNI.
Atualmente, o compartilhamento atinge só 8% do setor, que teve alta média de 3,8% no volume de cargas transportadas desde 2001. “As concessões realizadas nos anos 90 estão desatualizadas em relação às necessidades do setor por não existir esse compartilhamento da malha”, disse a especialista.
O crescimento médio, porém, se deve essencialmente à alta anual no período de 5,4% do transporte de minério de ferro, enquanto outras cargas cresceram apenas 0,4% ao ano. Enquanto em 2001 o minério de ferro representava 60% do fluxo da carga ferroviária, no ano passado o índice atingiu 77%.
Dados da CNT (Confederação Nacional do Transporte) mostram que as ferrovias transportam só 20,7% das cargas no país, ante os 61,1% do volume transportado por meio de rodovias.
De acordo com Ilana, com a antecipação das renovações dos contratos as concessionárias investiriam nas concessões que estão se aproximando do fim e evitariam um hiato de novos aportes no setor. O temor é que as empresas deixem de investir perto do fim dos contratos, o que agravaria as condições ferroviárias.
INVESTIMENTOS
“Em 2017, o governo federal investiu 85% do valor disponível em rodovias e só 6,6% em ferrovias. Nosso pico em anos recentes foi em 2010, quando as rodovias ficaram com 74% e as ferrovias, com 20%. Isso mostra que, quando o cinto apertou, o investimento se manteve para rodovia e a ferrovia ficou ainda mais abandonada.”
Na avaliação da especialista, isso ocorre pelo fato de as rodovias propiciarem retorno rápido, com impacto para a população, cenário que reforça esse tipo de política no curto prazo.
“É muito caro ter mais malha ferroviária, então temos pouca malha. Se você investe em rodovias, os traçados novos não são tantos assim, enquanto ferrovias têm problemas de desapropriação e custo burocrático, político e administrativo, além de o próprio investimento ser muito elevado. E projetos de engenharia ferroviária são mais complexos.”